quarta-feira, 18 de junho de 2014

“Recursos Não morfológicos na Formação de Palavras”,

1.     INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa numa situação preliminar falar sobre os “Recursos Não morfológicos na Formação de Palavras”, e suas respectivas formações tais como onomatopeia, o redobro (ou reduplicação), o amálgama, a eponímia, a extensão semântica, bem como algumas formas mais ágeis de utilizar palavras ou sequências já existentes; o caso do truncamento e acronímia, conceituando-as e citando exemplos e sua aplicabilidade no dia-a-dia.

2.     DESENVOLVIMENTO

a.     As palavras onomatopaicas são formadas por uma sequência de sons da fala que pretende reproduzir um dado estímulo não verbal. (Vilhalva, 2008, p. 53).
“Onomatopeia é uma palavra de origem grega que significava criação de palavras”.
 A sequência fonética ao reproduzir o som forma em sua excepcionalidade uma expressão linguística, é o caso de um doce de leite que tem sua marca registrada no Rio Grande do Sul como “mu-mu”, a partir de partícula do “mu-gido” da vaca, passa ter a identificação e seu uso consagrado, e por óbvio, sinônimo de coisa fácil, sem empreender esforço.
 
   Ex: João não trabalha e nem estuda, só quer “mu-mu”.

   Veja-se que o sentido na frase, não faz alusão que João, imite a vaca, e sim queira a obtenção de seus propósitos pela lei do menor esforço, sem dispender sacrifício, e nesta esteira teremos desmembramentos morfológicos com aumentativos “mumuzão” e diminutivos como “mumuzinho”.
          Recurso muito usual na poesia a onomatopeia, serve para complementar a ação, dar suporte ao verso, aumentando seu dinamismo e vivacidade.

               Ex: Plaft! Plaft! Sopre a tábua
                     Batendo a rouba encardida!
                     Plaft! Plaft! E a mão ferida
                     Já não suporta o sabão!
                     Plaft! Plaft! Sobre a tábua
                     Batendo a roupa encardida
                     Enquanto a mágoa da vida
                     Encardia o coração.
                                                         (Dimas Costa,1997,P.33)

b.    Redobro ou reduplicação

      Processo criação de palavras que consiste na repetição de uma palavra já existente, e frequentemente mais empregado com formas verbais, indica intensidade de ação: lufa-lufa e cai-cai são exemplos que me ocorrem para ilustração.
 
        Exemplos: Na lufa-lufa diária, esquecemos até de comer.
                      
                       Rodrigo nunca será um craque, é muito cai-cai.                  
            Note-se que lufar- verbo infinitivo. Significa soprar com força (o vento), sendo que no redobro “lufa-lufa”, representa na acepção popular; grande afã, pressa, e partindo da premissa que, falando de pessoas, cair significa perder o equilíbrio, levar uma queda, o redobro em “cai-cai”, dá o sentido pejorativo de pessoa que faz corpo-mole, e não se esforça para persistir.
c.     Amálgama
                      A amálgama designa um dos processos morfológicos de formação de novas palavras (neologismos), isto é, um dos tipos de neologia. Consiste numa unidade lexical (palavra) resultante de um processo morfológico que se baseia na fusão de duas ou mais palavras. Nesta fusão permanece o início da primeira unidade lexical e o fim da segunda, outras combinações são possíveis, sendo este recurso frequentemente utilizado na construção de nomes comerciais.
                    Exemplos: a amálgama telefonia consiste na fusão das palavras telefone e radiofonia, permanecendo o início da primeira (telefone) e o fim da segunda (radiofonia).
                    * telefonia = telefone + radiofonia
                     A amálgama “brincanagem” de uso popular na fala e não dicionarizada formalmente, é uma expressão comum utilizada, composta pela junção das palavras brincadeira e sacanagem.
                  *Você tá de brincanagem com a minha cara né?
                  O aparecimento de siglas tornou-se ingrediente ativo incorporado ao cotidiano, havendo o apagamento por se tratar de abreviaturas, e seus derivados colocaram-se no sistema gramatical da língua portuguesa.
                 Exemplo: EsFECS ( Escola de Formação de Cabos e Soldados)
*Os Esfecianos da Turma de 81 confraternizaram ontem.


d.    Eponímia

    Esta palavra se formou do Grego epi-, “sobre”, mais onyma, “nome”. Um epônimo é uma palavra que se usa para designar algo a partir do nome do criador ou de uma marca.

 Exemplos:
            “estrogonofe”. Gilete é filete - a marca da lâmina de barbear, criada por King Camp Gillete. Xerox é marca/fabricande de máquinas fotocopiadoras, Eu comprei uma maquina xerox (eu comprei uma fotocopiadora)
          O Strogonoff é um prato de origem russa; na verdade, chamava-se Strogonov. Tudo começou no século XVI por meio da alimentação dos soldados russos, os quais comiam rações de carne cortadas em barris com sal grosso e aguardente para preservar o alimento.
  Por meio de um cozinheiro do Czar russo Pedro, o Grande, a comida foi melhorada e refinada. O general que protegia o cozinheiro se chamava Strogonov; daí surgiu a ideia de dar tal nome ao prato.. Masoquismo é uma tendência ou prática parafílica, pela qual uma pessoa busca prazer ao sentir dor ou imaginar que a sente. Em um sentido extenso pode-se considerar como masoquismo também a forma de prazer com a humilhação verbal. termo masoquismo deriva do escritor austríaco Leopold von Sacher-Masoch.

e.     Truncamento

É  um processo de redução de uma palavra, que elimina uma sequência, geralmente final da palavra  (Vilhalva,2008,)., Sobre o  truncamento, especificamente, (Gonçalves,1999,) estabelece os seguintes critérios, buscando mostrar sua sistematicidade:
   O truncamento é um recurso morfológico de natureza expressiva. Assim, não há distanciamento de significado entre a forma reduzida e a palavra-matriz; o que há é a utilização da forma truncada para a expressão de um tipo específico de enunciado: a expressão do pejorativo. Ex.: analfa.
   O truncamento reproduz parte da base e acrescenta uma vogal final  –a, nem sempre presente na palavra-matriz. A vogal –a funciona como uma espécie de afixo de truncamento. Ex.: estrangeiro > estranja.
    A formação do truncamento não leva em conta o acento da base. Ex.:               baterista batera; flagrante > flagra
   O truncamento é sempre paroxítono.

f.      Acronímia

A acronímia é também um processo de redução, mas o seu domínio de intervenção é uma sequência de palavras. Em termos práticos, a acronímia consiste na criação de uma palavra a partir do(s) grafema(s)que se situa(m) no início das palavras que integram um título ou uma frase. A forma resultante é foneticamente realizada como um contínuo, e não como uma sequência de sons independentemente articulados. (Vilhalva ,2008)Acronímia – «Conjunto de processos morfológicos que levam à formação de acrónimos, cuja particularidade é a de serem pronunciados como uma palavra corrente; apresentam-se sob a forma de siglas, amálgamas ou de novas unidades lexicais. A acronímia é um fenómeno neológico muito produtivo em língua, com grande dinâmica, por exemplo, na atribuição de nomes próprios para designar novos objetos, instituições ou organismos. Exemplo:

SENASP – Secretaria Nacional Segurança Pública
ASCAF – Associação dos Criadores de Frango

g.    Sigla

          Termo complexo abreviado ou nome formado a partir das letras iniciais dos seus elementos. Uma sigla forma uma sequência cuja pronúncia é alfabética, silábica ou ambas. Exemplos: CEEE, IBGE,...

          h. Extensão Semântica

              Consiste na atribuição de um novo significado a uma palavra já existente, é um dos processos morfológicos de formação de novas palavras (neologismos), isto é, um dos tipos de neologia, na troca de vocabulário entre a língua geral e as línguas de especialidade, ou seja, um conteúdo semântico já existente passa a adquirir novas polissemias através do seu uso.

               Exemplo: Papel, substância constituída por elementos fibrosos de origem vegetal, os quais formam uma pasta que se faz secar sob a forma de folhas delgadas, para diversos fins: escrever, imprimir, embrulhar, etc.
             Ex: Este papel autoriza a entrega da encomenda. (recibo)
             Ela tem um bom papel na novela. (parte que o ator representa).
              Não aceitam ouro ,só papel. (Dinheiro)


i.       Por transposição semântica:
Nesse caso, não temos um novo significante, e sim, um novo ou significado atribuído ao mesmo significante, sem perda do significado original.  A lista, nesse caso, poderia ser longuíssima, com formações imprevisíveis: repaginados (Veja=com nova aparência), xiitas (idem=pessoa que é fanática por uma idéia), laranja (Veja=falso proprietário), mico (idem=mau negócio), grampear (idem=prender), gato (idem=ligação clandestina de eletricidade), turbinar, siliconar (idem=aumentar uma parte do corpo por cirurgias plásticas), provedor (idem=ligação com a Internet), mala (O Dia=pessoa inconveniente), montadoras (idem=fábrica de automóveis) etc.(Alves,1992).
Analisando os exemplos supramencionados, passamos discutir até     que ponto esses exemplos podem ser considerados ”palavras”, visto que as palavras do ponto de vista morfológico são estruturas ou unidades menores, sendo nomeados de constituintes morfológicos. Para tanto para termos palavra  é  necessário que um radical, um especificador morfológico, constituinte temático, especificadores morfossintáticos, que irão realizar a flexão morfológica.
Na onomatopeia as palavras formadas por uma sequência de sons, tendo um estímulo sonoro não verbal, os exemplos citados “ mu-mu” , corruptela do mugido da vaca e “plaft-plaftt” o som da roupa na tábua do tanque, nos passam a impressão sonora, e seus constituintes não preenchem os requisitos morfológicos para a formação de palavras. No redobro e duplicação cria uma terceira palavra, o segundo elemento e o clone do primeiro, empregado em formas verbais, portanto, palavra morfológica.
A amálgama, eponímia, o truncamento, anomínia e a extensão semântica podemos considerar palavras com suas particularidades e idiossincrasias, visto a manutenção dos processos morfológicos na origem da palavra e duas derivações.
Arriscamos afirmar que os processos levantados são recorrentes na Língua Portuguesa, tendo em alguns casos o impeditivo do léxico, se é dicionarizada ou não, e a questão da dinamicidade deveria ser acompanhada com atualização “dicionaral”?     

3. CONCLUSÃO

      Este trabalho não esgota o assunto e nem tem a pretensão e alcance para tanto, visa com base nos exemplos coletados mostrar a diversidade lexical da língua, enquanto organismo vivo, sofrendo influências na formação de palavras com recursos não morfológicos e sua ortodoxia e os acréscimos de expressões com inclinação mais fonológica que morfológica contribuição importante para a riqueza gramatical, na língua falada e escrita.
               Poeminha Ocasional  
    É preciso xerocar a sentença desta decisão Draconiana
     Pois até para um masoca , existem fardos mui pesados
     Plaft soa o tapa na cara
     No vagabundo que só quer mu-mu.
     Pois sendo, estranja e analfa  foi pego no flagra
     Na lufa-lufa diária brigando com a eletro telefonia
     Nesta brincanagem  que ora funciona, ora falha
     Fazer gato da CEEE e crime afim no SENASP
(João de Deus, Julho 2012)

 Referências Bibliográficas:
ALVES, Ieda. Neologismo: criação lexical. São Paulo: Ática, 1990. ípios)  
BASÍLIO, Margarida. Teoria lexical. 3. ed. São Paulo: Ática, 1991. (Série Princípios) 
COLLISCHON, Gisela. Acento secundário em português. Letras de hoje. Porto Alegre, v. 29, no. 4, p. 43-53, dez. 1994.
CRYSTAL, David. Dictionary of Linguistics and Phonetics. Blackwell, 2001.
KEHDI, Valdir.  Formação das palavras em português. São Paulo: Ática, 1992. (Série Princípios) 
LORD & ZUNG. How does the lexicon work? Word. v. 43, n.3, p. 349-373. 1992.
LUFT, Celso Pedro. Novo manual de português, gramática, ortografia oficial, literatura, redação, textos e testes. São Paulo: Globo, 1996. 
MONTEIRO, José. Morfologia portuguesa. Fortaleza: EUFC, 1986. 
ABREU, Rosa – Isso é uma palavra, Ver.ABRALIN, p.113-130,dez.2006
VILLALVA,A .Morfologia de Português, Lisboa:Univ. Aberta,2008,Cap.2